Capítulo II - Vida


Ao amanhecer, todos se deparam com Stamas na cozinha, preparando algo para comer. Ficam ao redor dele, desconfiados ainda, olhando uns para os outros, em um silêncio que só é quebrado quando Ruth pergunta: 
 
— Agora pode nos explicar melhor o que faz aqui? 
— Já disse, preciso preparar vocês para o que está por vir. — responde ele estalando alguns ovos — Mas, estamos com tempo. O livro está em nossas mãos, então, vantagem para nós. 
— E o que vai fazer com o livro? — pergunta Jéssica. 
— Vou achar as localizações das chaves. Irão buscar. E guardaremos. 
— E por que você mesmo não pega? — pergunta Leonardo. 
— Eu tenho uma restrição universal. 
— O que isso significa? — pergunta Aurora. 
— Cada chave tem um “dono” por assim dizer, que é definido pela essência dele. Caso contrário, se eu que não tenho ligação com nenhuma delas, minha essência será despedaçada. 
— ‘Oloco’! Quem fez isso com você? — pergunta Gabriel. 
— Amanda. 
— Conheceu ela!? — indaga Guilherme. 
— Sim, ela era a Guardiã original das chaves. — diz Stamas dando café para todos, menos para Gabriel — Após sua morte, estão desprotegidos e a resta vocês esse dever. 
— E por que ela fez isso com você? — pergunta Jéssica. 
— Acabei brincando com o tecido do universo. Era novo, tinha menos de 500 anos na época. 
 
Guilherme se engasga com o café e se surpreende, dizendo: 
 
— 500!? 
— Sim, sim, mas isso foi a muito tempo. Estou mudado agora. 
 
Stamas dá o lanche para todos e dizem: 
 
— Vão, está na hora da escola. O ônibus irá passar em alguns minutos... 
— Nós vamos no carro. — diz Leonardo. 
— O trânsito está cheio e a aula começa em 15 minutos. 
 
Cada um põe a mochila nas costas e vão para a garagem, que era ligado ao túnel da via principal. 
 
— Boa aula meninos. — diz Ruth. 
— Obrigado. — dizem. 
 
Quando ouve o carro saindo, Guilherme e Ruth sentam-e nos bancos do balcão, com Stamas de costas para eles, botando as omeletes nos pratos. 
 
— Agora, nos diga, quem é você. — diz Ruth, em tom de ordem. 
 
Ele bota os pratos a frente deles e diz: 
 
— 9 meses atrás, pra vocês, aconteceu a noite da explosão. Eu era apenas um morador de rua, tinha uns oito anos na época. Quando a rajada de energia me atingiu, fui jogado para a dimensão do meio. 
— O que é isso? — pergunta Guilherme. 
 
Stamas levanta suas mãos e pequenas rajadas de energia criam um holograma, que ajuda em sua explicação: 
 
— No mundo, existe diversas dimensões, ou como são conhecidas também: "Realidades alternativas". Mas, quando acontece algo com o espaço-tempo, essas dimensões criam pequenas rachaduras entre uma e outra, deixando um espaço vazio que chamamos de "Dimensão do Meio". 
— Como a zona anti-temporal? — pergunta Ruth. 
— O lar dos Guerreiros do Zodíaco, isso mesmo! Lá, eu tive meu corpo e mente aprimorados. Meu corpo foi elevado, aprendi a usar 100% da capacidade humana. E como o tempo não existia, aprendi a criar e moldar ele a minha vontade. 
— Por isso sabe magia? — pergunta Guilherme. 
— Os humanos chamam de magia, mas na verdade, é apenas a energia do cosmo do universo. Capaz de ser usada através desses aparelhos. — diz ele mostrando seus braceletes em cada pulso. 
 
Guilherme e Ruth ficam calados e Stamas pergunta: 
 
— E então, confiam em mim? 
— O suficiente — responde ela — Eu vou indo, boa sorte para achar seu metrequefo. Quando achar, vamos pegá-los. 
— Okay, vamos garoto — diz Stamas com Guilherme — Precisarei de ajuda. 
 
Na floresta... 
Õkami e valete se preparam para sair com o nascer do Sol, com ela arrumando pouco do que trouxe, que não passava de outro molde de roupa e uma foto recortada. 
 
— Como seu amigo sumiu? — pergunta ele — E por que pediu justamente a minha ajuda? 
— Não quero meter minha irmã e os amigos dela nisso. E vou precisar de alguém com sangue frio. 
— Um monstro, em outras palavras. 
 
Ela se vira pra ele e diz: 
 
— Um monstro não estaria protegendo este lugar, estão destruindo. Eu preciso de você, porque é como eu. Não tem medo de fazer o que tem que fazer, se for pelo certo e o errado. Mas não se preocupe, eu sei o que a Ruth lhe ensinou, não irei contra a sua ética, apenas quero que me ajude. 
— Certo. E como vamos resgatar seu amigo? 
— O Matheus foi sequestrado por um grupo que eu nem sei quem são, mas sei o que querem. 
— O que? 
— Alguns meses atrás ele desenvolveu um programa que é capaz de invadir redes de segurança e controle de qualquer tipo de aparelho de comunicação. 
— Não parece grande coisa. Qualquer hacker consegue fazer isso. 
— Não como esse, é acesso total... — fala apontando para sua própria cabeça. 
— O que? 
— Matheus foi um dos transformados, daquela explosão maluca, não sei como, mas ele acabou meio que... Se fundindo com esse sistema. 
— Okay... Vamos achar logo o garoto. Tem alguma pista dele? 
— Foi visto pela última vez no nosso esconderijo, a estação de trem abandonada. 
— Certo. Vamos. 
— Vai ser divertido botar você dentro de um avião. 
 
Na escola... 
O sinal toca, ecoando pelos corredores do colégio como um lembrete de que, por mais que vivessem em sombras à noite, de dia eram apenas estudantes comuns. Cada um segue para seu armário, espalhados pelos corredores como peças de um quebra-cabeça que ninguém conseguiria montar. 
Jéssica apressa o passo pelo corredor Sul, os passos leves e determinados ecoando entre os alunos que se dispersavam.  Enquanto puxava o zíper da mochila, quase sem olhar para frente, virou a esquina... e deu de cara com alguém. 
 
— Aí — diz ela se levantando, pois atinge sua perna com a cadeira de rodas de Jacob. 
— Desculpe, ainda estou aprendendo a andar com esse novo modelo. 
— Tudo bem... A quanto tempo. 
— Sim, muito. Ah, pega, você faltou ontem aí peguei o horário para você — diz ele pegando um papel de sua bolsa, que estava acoplada em sua cadeira. 
— Ah, muito obrigada — diz ela com um sorriso. 
— Faltar o primeiro dia de aula, corajosa. 
— Tive que ir em uma viagem de última hora... Bom, quer que eu leve até seu armário? 
— Seria ótimo, eu ainda tô aprendendo a manusear ela. 
 
Jéssica empurra a cadeira e no caminho vão conversando. 
 
— Ainda no mesmo no lugar? — pergunta ela. 
— Na verdade, somos vizinhos de armários. 
— Sério? O que aconteceu com o engraçadinho que ficava do meu lado? 
— Ele simplesmente sumiu no fim do ano passado. Ninguém tem notícia dele. Alguns tão falando que foi problema de saúde. 
— Meu Pai... Ah, mas ainda bem que ficou você. 
— Sim, sim, agora vou procurar adaptar pra mim, já que né... Mas ei, pode acelerar? Temos aula em 5 minutos. 
— Se segura! — diz ela com empolgação. 
 
Ela começa a correr e empurra ele com mais velocidades, correndo pelos corredores. 
 
Na Sede dos Maias... 
Samantha anda em direção à sala de reuniões, que logo Ilidan a acompanha. 
 
— Tá pronta? — pergunta ele. 
— Sim... E não. Se conseguirmos isso, vamos conseguir concretizar a Aliança. 
— Eu sei que vai. 
 
A "Aliança" é um dos primeiros planos feitos por Samantha para conseguir criar uma força capaz de combater qualquer ameaça futura. Reunindo as principais agências criadas pela ONU quando necessário. 
Eles se aproximam da porta blindada. Ela se abre com um chiado hidráulico, revelando a sala de reuniões — fria, quase clínica. As luzes de presença se acendem em sequência, criando um corredor de claridade até a mesa central. 
Ilidan não entra. Ele se posiciona na porta como uma sentinela, vigilante. Não era apenas protocolo — havia risco real ali. A qualquer momento, um passo em falso poderia transformar diplomacia em desastre. 
Samantha se senta à frente das três telas curvas. O console diante dela pulsa suavemente, aguardando comando. Ela desliza a mão sobre os sensores e ativa o sistema. Um leve zumbido toma o ar, e os monitores ganham vida. 
Primeiro, surgem os símbolos das agências: um símbolo da via láctea, uma tempestade de raios e uma ampulheta. Em seguida, os rostos aparecem, um a um, através de transmissões criptografadas. Os diretores. Cada um com um olhar frio, calculado. Líderes de organizações que poderiam proteger ou destruir na mesma medida. 
O silêncio inicial é carregado. Nenhuma saudação. Nenhum sorriso. 
 
— Olá, obrigado por aceitarem os convites — diz ela — Senhorita Claudia, Senhor Jheovane e Senhora Kátia. 
— É um prazer entrar em contato com a responsável pela equipe que salvou parte do mundo — diz Claudia. 
— Mas, sobre o que se trata essa reunião? — pergunta Jheovane — Já que fez questão de um suspense enorme. 
— Quero oferecer um acordo entre nós. Cada um cuida de uma parte da segurança mundial. Ameaças cósmicas, fenômenos da natureza, riscos temporais... Separados podemos impedir e controlar a maioria dos problemas, mas como sabem... A humanidade evolui a cada dia e junto a ela, a crueldade. Por pouco conseguimos impedir Alfa, mas foi algo que chamo de sorte. Ameaças piores estão por vir e queria criar a Aliança. Para em momentos de crise, estarmos juntos. 
— Você quer criar uma força armamentista? — pergunta Jheovane. 
— Mais do que isso — responde Samantha — Quero unir mentes. Solucionar problemas que normalmente seriam precisos meses, ou até mesmo anos em questão de dias. 
 
Todos ficam em silêncio por um momento e dizem: 
 
— É algo audacioso — diz Kátia — Não funcionaria em qualquer crise. Minha agência é a responsável de resolver problemas temporais e um dos prisioneiros que está em sua custódia tem justamente habilidades temporais nunca antes vistas. Em nenhum momento fui informado disso, só depois de sua captura. 
— Assim como Amanda, uma ex-agente de vocês — fala Claudia — Tinha essas mesmas habilidades. Mas se manteve calada por anos. Como espera que tenhamos confiança em vocês com tudo isso? 
 
Samantha se cala, não tem resposta para aquilo, de fato esconderam uma peça importante por muito tempo, mas como iria explicar que fazia parte de um plano maior que foi confiada por um tiro no escuro de Amanda e Verônica. Seu silêncio não é recebido por os outros diretores, que cobram uma resposta apenas com os olhares. 
 
— Por isso que estou pensando nessa aliança. Transparência entre as agências e — 
— Me parece bastante conveniente essa aliança apenas quando os Maias estão se reestabelecendo — diz Kátia — Quando estavam em “seus tempos de ouro”, qualquer comunicação era rara. 
— Algo que estou querendo mudar. 
— Nos dê 24 horas para pensarmos sobre — diz Claudia. 
— Entraremos em contato assim que possível — diz Jheovane. 
 
Eles desligam e Ilidan liga as luzes. 
 
— Será que vai dar certo? — pergunta ela. 
— Claro que vai. 
— Seu otimismo é estranho — diz ela botando suas mãos em seus ombros, aproximando seus rostos. 
— Por quê? 
— Sai como se fosse um deboche. Eles não gostaram da ideia. 
— Verônica tinha muitos segredos. E você como sucessora, tem que lidar com isso, com esse fantasma dela. 
 
Eles sorriem e seus lábios se tocam. 
 
No QG da equipe... 
Guilherme ajuda Stamas a achar as chaves. 
 
— Por que preciso fazer esse risco no chão? — pergunta ele. 
— Não é apenas um "risco". É uma escritura antiga. 
— O que significa? 
— Concentração. 
 
Guilherme termina de desenhar o símbolo no chão, que era uma grande circunferência seguida de símbolos parecidos com o do dia anterior. Stamas se senta no meio e abre o livro, todos o símbolo começa a brilhar e ele a flutuar, lendo calmamente. 
 
— Isso pode demorar um pouco garoto — diz ele — Faz um chá pra gente, por favor. 
 
Na escola... 
No horário do almoço, todos saem para o refeitório e Leonardo vai para seu armário pegar sua carteira para comprar algo para comer. 
 
— Oi — diz Liz chegando perto dele. 
— Oi — responde ele com certo cansaço em sua voz. 
— Eu sei que é você — diz ela, entusiasmada. 
— Eu o que? — pergunta sem entender, pegando sua carteira. 
— Você sabe... 
 
Leonardo olha confuso para ela, que começa a fazer um gesto na mão, como se fosse atirar em um arco e flecha. Ele se alerta, mas permanece calmo. 
 
— Eu... Não sei do que tá falando. 
— Qual é, você me salvou meses atrás. Eu não lembrei no dia, por conta que fiquei hospitalizada até o fim do ano letivo. Mas, com essas voltas as aulas, assim que vi você hoje cedo, lembrei na mesma hora. 
— O acidente foi muito forte, deve ter batido com a cabeça. 
— Eu nunca disse que sofri um acidente. 
— ... Droga. 
— Eu sou praticamente uma jornalista. Sabe, eu trabalho no jornal local. Se eu quiser... 
— Okay, o que quer para ficar entre nós? 
 
Ela o sorri e o deixa desconfiado. 
 
No refeitório... 
Todos se sentam na mesa de sempre, conversando sobre o dia de aula, com várias vozes de alunos indo e voltando. Aurora olha de um lado a outro e pergunta: 
 
— Vocês viram o Leo? 
— Não... Ele deve tá na lanchonete, ele disse que ia comer a mais hoje — responde Gabriel. 
— Preocupada em? — pergunta Jéssica. 
— Não. Só notei que tem um lugar sobrando. 
— Qual é, ele te beijou naquela noite. Não rolou nada depois daquilo? — pergunta Gabriel. 
— Somos amigos, e é isso. 
— Comida de escola é sempre a mesma coisa. Mesmo que eu nunca tenha frequentado uma. — diz Ruth sentando-se com eles. 
— RUTH!? — indaga Gabriel. 
— Eu! — responde ela com um olhar de surpresa irônico. 
— O que faz aqui? — pergunta Aurora. 
— É, achei que não estudasse. — diz Jéssica. 
 
Ela mostra o distintivo que usava com um cordão e diz: 
 
— Sou a segurança da escola. Samantha mexeu uns pauzinhos para ficarmos próximos. 
— Maneiro — diz Gabriel. 
— E aí galera — diz Leonardo sentando-se junto a eles. 
 
Ele olha para Ruth e ela olha de volta, sem reação, apenas com um sorriso irônico. 
 
— Aluna nova? — pergunta ele. 
— Sim, estou na sua turma de francês. 
— Não temos aula de francês. 
— Mamamia... — fala sem interesse. 
 
Aurora solta uma leve risada e ele ri logo depois. 
 
— Demorou — diz Jéssica. 
— É... Sim, eu tive um imprevisto. 
— A lanchonete estava lotada? — pergunta Gabriel. 
— Sim, sim... Tenho uma coisa pra dizer pra vocês. 
 
Antes que ele termine, o copo de água de Jéssica começa a se agitar e cai na mesa, derramando o líquido e assim, o rosto de Stamas se forma com ela. 
 
— Olá meninos. Espero que estejam bem alimentados. Preciso de vocês. 
— Isso é sério? — pergunta Leonardo — Ele se formou com água? 
— Estamos no meio do dia de aula, não temos como sair — responde Jéssica. 
— Isso não será problema. Vão para os banheiros. 
 
Eles se levantam e vão em direção aos boxes dos banheiros. 
 
— O cara mal chegou e ele já quer mandar na gente — diz Leonardo, reclamando. 
— Pelo menos não vamos ter aula — diz Gabriel. 
 
Jéssica, Aurora e Ruth vão para o banheiro feminino e Leonardo e Gabriel para o masculino. 
 
— Okay — diz Jéssica — E agora? 
— Esperamos? — pergunta Aurora. 
— Vamos ver o que ele quer — diz Ruth. 
— Só espero que não sejamos sugadas pela privada — diz Jéssica, causando olhares estranhos vindo de Aurora e Ruth, que viram seus rostos para ela lentamente 
 
Enquanto isso, os meninos ficam rodando o banheiro até que as portas dos boxes se abrem e a água começa a vazar da privada. Indo em direção a eles, a água começa a tomar forma humana até que em instantes, ficam de frente a eles, reflexos perfeitos deles mesmos. Leonardo se vira e vomita na pia. 
O mesmo acontece com as meninas. 
 
— Uou — diz Jéssica — Isso é muito maneiro. 
 
Gabriel ajuda Leonardo a se recompor e olham com calma para seus clones, mas logo os clones os abraçam e se afogam na água, que caem no QG da equipe. 
 
— QUE NOJO — grita Leonardo — NÓS LITERALMENTE ABRAÇAMOS ÁGUA DA PRIVADA. 
— Desculpem — diz Stamas — Os clones irão agir como vocês até que voltem. 
 
Todos se levantam e Stamas continua: 
 
— Achei uma das chaves. A Chave da Vida. 
— Onde ela está? — pergunta Jéssica. 
— No Reino de Atlântida. 
— Realmente existe? — indaga Gabriel — Maneiro. 
— Atlântida? — pergunta Leonardo — Na água? Tipo, embaixo da água... Submersa. 
— Essa mesma — diz Stamas — Ela foi destruída e abandonadas a alguns séculos, mas a chave continuou lá, protegida e guardada. 
— E o que faremos quando acharmos? — diz Ruth. 
— Irão saber no momento. Mas tragam em segurança, antes que o mau chegue antes de vocês. 
 
Todos se dirigem ao teleporte para irem para a Sede, pegar o jato. Mas, Ruth encara ele por mais alguns segundos e repete em mudo: “Mau?”. Stamas não responde e ela segue o restante. 
 
— Boa sorte, meninos — diz Stamas. 
 
Na escola... 
Os clones da equipe andam calmamente para suas salas. Mas, o clone de Gabriel acaba se esbarrando em Ygor, o metido a valentão da escola. 
 
— Qual é? Tá cego? 
 
O clone não responde nada, apenas continua andando. Ygor se irrita e empurra o clone pelas costas, mas por conta de ser feito de água, atravessa direto, caindo no chão. Com isso, todos os outros alunos se juntam ao redor e ficam olhando o que parecia uma briga. 
 
— Okay seu idiota, você que pediu. — diz se levantando para ir bater nele. 
 
Logo, os reflexos do clone são ativados e desvia dos ataques com facilidade, solidifica sua cabeça, batendo na dele, fazendo-o cair no chão. O restante dos alunos vibra com isso, com gritos e aplausos. 
 
No jato a caminho para Atlântida... 
 
— Guilherme adaptou seus uniformes para serem próprios para de mergulho. Botem as máscaras que terão oxigênio por uma hora. Aguentarão a pressão da zona abissal, mas ainda assim, sentiram desconforto. Tomem cuidado. 
— Obrigada, Carmen. — diz Ruth.  
— Todos precisam ir? — pergunta Leonardo — Não seria melhor um de nós ficar no jato? 
— Todos — responde Ruth. 
— Mas, qual é o plano? — pergunta Gabriel. 
— Stamas deixou as coordenadas para ficarmos bem em cima da chave. Desceremos e vamos ver a estrutura no qual ela está. Pegamos e voltamos. 
— Estamos próximos do local. 
— Vamos. — diz Ruth. 
 
Todos andam ao saguão do jato, mas antes, Ruth segura Leonardo, dizendo: 
 
— Achei que tivesse superado seu medo de água no treinamento com o Aquário. 
— Ali foi no puro desespero. 
— Pode ficar. 
— O que? Mas, você disse todos. 
— Não irá se concentrar na missão se ficar apavorado. Fica. 
— Obrigado. 
 
Ela acena e dá um sorriso com canto de boca e prossegue com os outros. 
 
— E o Leo? — pergunta Jéssica. 
— Ele vai ficar. Vai ser uma missão de busca, então conseguimos dá conta. Alguém precisa ficar no jato caso algo aconteça. 
 
Ao tocarem o bracelete, os uniformes se materializam sobre seus corpos, moldando-se com precisão — máscaras e óculos de mergulho incluídos. O portão da aeronave se abre, liberando uma rajada de vento. Sem hesitar, eles saltam lado a lado, despencando cinco metros até romperem a superfície do oceano. 
Sob a água, os uniformes emitem um brilho suave, iluminando o caminho à frente enquanto afundam em direção às profundezas. À medida que descem, os contornos de uma civilização perdida começam a surgir entre sombras e areia: colunas quebradas, estátuas caídas, pedaços do que um dia foi grandioso. Mas é uma estrutura em particular que prende seus olhares... 
 
— Eu aposto tudo que tenho se a Chave não tiver ali — diz Gabriel se referindo a um castelo logo a frente. 
— Muito maneiro — diz Jéssica com um suspiro. 
— Vamos. 
 
Eles seguem em direção à estrutura que chamou sua atenção — um castelo colossal, parcialmente engolido pelo tempo e pelo mar. Suas torres desgastadas erguem-se como sentinelas silenciosas, cobertas por corais e musgo, enquanto esculturas antigas decoram os arcos partidos, como se ainda guardassem segredos esquecidos. 
Apesar da ruína, há algo majestoso ali — um traço de glória intacta, como se o castelo ainda sussurrasse histórias de reis submersos e batalhas perdidas nas marés. O brilho dos uniformes reflete nas paredes enegrecidas, revelando símbolos entalhados e portas entreabertas que convidam — ou desafiam — a entrar. 
 
No jato... 
Leonardo gira lentamente na cadeira giratória, o som metálico discreto preenchendo o silêncio da cabine. O rosto carrega uma mistura de tédio e inquietação — mas, no fundo, é o peso da decisão de ficar para trás que o incomoda. Ele lança um olhar para o visor à frente, onde os sinais vitais dos colegas brilham em tempo real, cada um mergulhando mais fundo no desconhecido. 
 
— Algo o incomoda, senhor Leonardo? — pergunta Carmen. 
 
Ele para de girar e suspira, apoiando os cotovelos nos joelhos. 
 
— Só esse medo bobo. Carmen, você tem algum medo? 
— Sou uma inteligência artificial. Não possuo esse tipo de sentimento. Mas compreendo a importância do medo como mecanismo humano de autopreservação. 
 
Leonardo esboça um sorriso torto. 
 
— Entendi… sorte sua. 
 
Há um breve silêncio. Carmen, quase como se ponderasse, continua: 
 
— No entanto, a coragem não é ausência de medo. É agir apesar dele. E você ainda está aqui, monitorando a missão, auxiliando sua equipe. Isso também exige bravura. 
 
Leonardo balança a cabeça, sem saber se Carmen está apenas sendo eficiente… ou gentil. 
 
— Só me avisa se aparecer alguma coisa com mais de oito tentáculos, tá? 
— Alerta de cefalópodes ativado — responde Carmen com uma inflexão sutil de humor. 
 
Leonardo ri baixo, aliviando um pouco o nó no peito, enquanto observa as imagens subaquáticas projetadas na tela — ainda longe da água, mas não tão distante assim da missão. 
 
No castelo... 
Ao atravessarem o arco colossal da entrada, são surpreendidos por algo inesperado — uma mudança sutil na pressão, como se tivessem atravessado uma membrana invisível. O ambiente muda. De repente, não há mais água. Dentro do castelo, há uma enorme câmara preenchida por ar, como se uma bolha protegesse aquele lugar do oceano ao redor. 
Eles tiram as máscaras, trocando olhares surpresos ao perceberem que conseguem respirar normalmente. O ar é úmido, mas puro — sustentado, talvez, pelas plantas exóticas que crescem entre as rachaduras das paredes e no chão coberto por musgo esmeralda. 
A luz que banha o interior não vem do sol, mas de cristais incrustados no teto abobadado e nas colunas espalhadas pela sala principal. Eles emanam um brilho suave, pulsante, em tons de azul e violeta, iluminando cada detalhe com uma beleza etérea. 
A arquitetura, embora gasta pelo tempo, ainda mantém traços de imponência. As paredes são cobertas por símbolos antigos e relevos que contam histórias esquecidas. É como entrar em uma catedral submersa — sagrada, silenciosa e viva. 
 
— E agora? — pergunta Aurora, olhando em volta, os olhos refletindo o brilho dos cristais. — Esse lugar é enorme... Levaríamos horas para encontrar o que estamos procurando. E nem sabemos exatamente o que é. 
— Vamos nos separar — propõe Ruth, já analisando as rotas possíveis. — Se encontrarem algo ou se estiverem em perigo, avisem pelo rádio. 
— Certo — respondem em uníssono, trocando olhares determinados. 
 
Cada um segue por uma direção: Ruth sobe uma escadaria coberta de musgo, Aurora desce por um corredor úmido que lembra um calabouço, Gabriel toma o caminho à direita, e Jéssica segue pela esquerda, guiada por pura intuição. 
 
Subindo os degraus com cautela, Ruth observa detalhes finos nas paredes — tapeçarias fossilizadas, escudos ornamentais enferrujados e candelabros de cristal apagados. Mas algo no chão a faz parar. 
 
— Pegadas? — murmura, se abaixando para analisar melhor. 
 
São recentes. Leves, mas visíveis na poeira acumulada. 
 
— Meninos, fiquem atentos. Acho que pode haver vida aqui dentro — diz ela pela escuta, os sentidos agora mais alertas. 
 
Seguindo as marcas, ela se depara com um ambiente surpreendente: um andar luxuoso, com corredores amplos, salões com tetos abobadados e cômodos que lembram quartos reais. Em um deles, um grande salão de baile se estende à sua frente, como se aguardasse convidados que nunca vieram. 
 
Enquanto isso, Aurora desce por um túnel estreito, com as paredes cobertas por inscrições e desenhos ancestrais. Ela passa a mão sobre uma das figuras e ativa seu comunicador. 
 
— Carmen, registre tudo. Vamos mostrar isso ao Stamas quando voltarmos. 
— Gravando e analisando... — responde Carmen, sua voz ecoando baixinho no capacete de Aurora. 
 
Gabriel caminha pelo corredor da direita, maravilhado. Seus olhos brilham como os de uma criança entrando em um museu vivo. 
 
— Eu me sinto tão pequeno... — sussurra para si mesmo ao chegar em um grande salão.  
 
Diante dele, degraus monumentais levam até um trono esculpido em pedra negra e adornado com ouro corroído. Um único degrau é quase do seu tamanho; ele precisa recuar para admirar o todo. 
 
Jéssica segue seu instinto por corredores silenciosos até parar diante de uma porta imensa, trabalhada em um tom azul profundo que lembra cristais em estado bruto. Ao tocá-la, uma onda de energia percorre seu corpo — sua visão escurece por um instante. 
Imagens surgem em sua mente como lampejos: uma civilização antiga, figuras se ajoelhando, realizando um ritual… e no centro, envolta em luz, a Chave da Vida. Ela sente o peso daquele sacrifício — uma civilização inteira selando algo para protegê-la. 
Ofegante, ela se afasta um passo e ativa a escuta: 
 
— Gente, corre aqui. Agora. 
— Estamos indo — respondem imediatamente. 
 
 
Os clones permanecem imóveis em suas respectivas aulas, suas expressões vazias. Na aula de Filosofia, um rapaz se senta ao lado de Aurora, fixando nela um olhar intenso, cheio de autoconfiança. 
 
— Oi — diz ele, sorrindo com aquela segurança de quem sabe que chama atenção. — Sou o Bruno. Acho que você já me viu por aí, ou pelo menos já ouviu falar. Olhei você de longe e, sinceramente, achei que devia te chamar para sair amanhã. Que tal a gente beber algo ou assistir a um filme na minha casa? Meus pais vão viajar, vai rolar uma “reunião” entre amigos. 
 
Aurora não responde. Nem pisca. Nem um gesto. Bruno, impaciente com o silêncio, se inclina e discretamente põe a mão sobre a perna dela, deslizando lentamente. Em seguida, deposita um bilhete no bolso de trás da calça dela e dá algumas batidas leves no ombro, como um toque final. 
 
— Te espero lá. 
 
Bruno é o galã da escola — ou pelo menos é assim que se enxerga. Com um corpo atlético e rosto bem-feito, ele acredita que nenhuma garota do campus consegue resistir ao seu charme irresistível. 
O sinal de fim de aula toca, e os alunos começam a se levantar e trocar de turma, deixando Bruno com seu sorriso convencido e Aurora imóvel, como se nada tivesse acontecido. 
 
No Castelo... 
De frente para a porta, pensam como abrir ou derrubá—la. 
 
— Parece ser aberta por algum tipo de código. — diz Aurora. 
— Como assim? — pergunta Ruth. 
— No calabouço, vi desenhos dos antigos e mostravam uma pessoa abrindo as portas com suas mãos nesses dois buracos — diz ela se referindo a duas estruturas na porta, uma de cada lado. 
— Senhorita Aurora. Sobre as escrituras, creio que posso ter uma tradução. Estavam em grecoromano, tomei liberdade de traduzir. 
— Qual seria a tradução? Por favor — pede Aurora. 
— “No coração do silêncio, onde o tempo repousa, 
 Escondida entre sombras, a Chave repousa. 
 Não é força, nem poder que a faz despertar, 
 Mas aquele que à vida sabe honrar. 
Não o tirano, nem o que tudo destrói, 
 Mas aquele que em cada gesto, a essência constrói. 
 Valorizar o pulsar, o respirar, o sentir, 
 Só o escolhido pode a Chave abrir.” 
— Jéssica, vai ter que ser você — diz Ruth. 
— Por que eu!? — indaga ela. 
— “Vida” e toda essa poesia — responde ela, um pouco impaciente — Não sei, sinto que é você. A que mais dá valor a vida dentre nós. 
Ela respira fundo, o ar pesado de tensão. Com determinação, encaixa as mãos nas duas aberturas da porta — e, no mesmo instante, os detalhes em azul brilham com mais intensidade, como se a estrutura respondesse ao seu toque. 
Jéssica fecha os olhos. Uma onda de energia percorre seu corpo, e então... começa a ver. Primeiro, vultos indistintos, sombras que dançam ao redor. Aos poucos, tomam forma. Cenas surgem diante dela como memórias de um tempo que não viveu. E então, algo familiar — um confronto. Um rosto. Um nome escapa de seus lábios, quase como um sussurro: 
 
— Ruth...? 
 
Uma única lágrima escorre por sua bochecha, que faz curva em seu sorriso. 
Como se o castelo tivesse ouvido e reagido, uma força invisível explode da porta. Uma energia bruta, ancestral. Ela é arremessada para trás, como se tivesse tocado em algo sagrado demais. 
Mas não atinge o chão. Nem uma parede. Em vez disso, braços firmes a amparam no ar. 
Jéssica abre os olhos, atordoada. Está nos braços de um homem de aparência serena. Seu rosto é calmo, os cabelos penteados para trás com perfeição, e os olhos — olhos profundamente negros — a observam com um sorriso gentil. 
Por reflexo, ela se afasta de um salto. Há algo errado. Ele não está usando traje de mergulho. Não parece molhado. Está... impecável. Um terno preto, como se tivesse saído de um outro tempo. 
 
— Olá, obrigado por arranjarem um meio de abrir. Estava à espera de vocês. 
— E quem é você? — pergunta Ruth. 
— Sou apenas uma pessoa normal, que quer o que está por trás daquela porta. Agora, me façam o favor de acelerar as coisas, não gosto de esperar. 
— Fada, abre a porta. Tira a Chave e vai para o jato. Vamos cuidar disso — diz Ruth. 
— Na verdade, preciso falar com você. 
— Não é o melhor momento. 
— É sério. 
 
Aurora e Gabriel se aproximam tomam frente e se preparam para o combate com suas armas em mão. 
 
— Dois contra um? — pergunta ele — Não parece muito justo, não é? 
 
O homem desvia com calma das lâminas que passam zunindo ao seu redor. Seus movimentos são quase dançantes, fluidos, como se já soubesse onde cada golpe iria cair. Gabriel surge logo em seguida, girando os bastões com precisão, tentando acertar o rosto do estranho — mas o homem intercepta o ataque com apenas uma mão, empurrando-o de lado no exato momento em que Aurora lança novas lâminas em sua direção. 
Sem hesitar, ele se esquiva com elegância, como se o tempo estivesse desacelerado para ele. Num só movimento, derruba Gabriel no chão e parte para o confronto direto com Aurora. Corpo a corpo. 
Ela avança, rápida e feroz, mas ele acompanha cada golpe como se estivesse prevendo seus movimentos. Os dois lutam de igual para igual — Aurora com sua técnica afiada e velocidade, ele com uma precisão inquietante, desarmado, mas implacável. 
Gabriel se levanta e retorna à luta. Agora os dois atacam ao mesmo tempo, coordenados. Mas é inútil. 
O homem move-se com controle absoluto. Desvia de socos, esquiva de chutes, bloqueia lâminas e bastões com um domínio que parece impossível. Em um instante, retribui os ataques com eficiência cirúrgica — nada letal, mas firme o suficiente para forçá-los a recuar. 
Num último giro, ele para no centro da sala, intacto. Nem uma gota de suor. O olhar calmo, como se tudo aquilo não passasse de um ensaio. 
 
— Eu disse que não seria justo pra vocês. 
— Quem é você? — pergunta Gabriel, incredulo. 
— Lucian, é um prazer. 
 
Ruth olha a cena apreensiva, vira para Jéssica e pergunta: 
 
— O que foi? 
— Na verdade, quem vai abrir a porta é você. 
— O que? 
— Quando tentei abrir, tive uma visão, na verdade uma visão do futuro, bom isso não importa, acontece que quando eu fui expulsa do plano que eu tava, eu senti que quem deveria estar no meu lugar ali era você, como se a chave ou algo assim, me desse essa dica. 
— Isso não faz sentido. 
— Por favor — fala ao pegar nas mãos de sua amiga — Você tem que tentar. 
 
No jato... 
Os alarmes tocam e Leonardo se desespera. 
 
— O que foi isso? 
— O sistema de segurança pessoal foi ativado. 
— O que é isso? 
— Um sistema que Guilherme colocou em seus uniformes. Seus amigos estão em perigo. 
 
Na tela principal, é mostrado a visão das máscaras deles. 
 
— A Aurora... Tá apanhando!? Carmen, é algum transformado? 
— Pela radiação que emana do seu corpo, sim. 
— Droga, droga, droga... 
 
Leonardo tenta ir ajudar, mas é paralisado pelo seu medo. 
 
— Como eu queria ser como ela... Como a Ruth, sem nenhum medo. 
— Mas, a senhorita Ruth tem medo. Inclusive, é o mesmo que o seu: Talassofobia. Por isso ela orientou você a ficar, entende seu pânico. 
— O que? Sério? 
— Sim. Tenho registrado todas os exames psicológicos de cada um da equipe em meu disco rígido. 
— Mas, ela conseguiu ir numa boa. 
— Coragem não é a ausência do medo — é usá-lo como desafio e encará-lo de frente. É daí que ela nasce. 
 
Ele sorri e enxuga seus olhos, pensando no que Carmen lhe disse. 
 
No Castelo... 
Ruth se aproxima da porta imponente, repousando as mãos sobre os símbolos antigos que brilham com uma luz suave. Fecha os olhos e se concentra, sentindo a energia vibrar sob sua pele — algo antigo, profundo, chamando por ela. 
De repente, o mundo ao seu redor se dissolve. 
Seu corpo parece flutuar, leve como uma pluma, enquanto é puxada para dentro de um espaço etéreo. Tudo à sua volta é feito de luzes cintilantes e fragmentos de memórias, como se estivesse dentro de um sonho. Um plano astral. 
Ali, diante dela, ergue-se uma figura colossal. 
Um homem de proporções gigantescas, com vestes reais que pareciam feitas de correntes de água e ouro líquido. A barba longa se misturava com o brilho das estrelas ao fundo, e seus olhos... Olhos que continham o peso de eras. 
Era o antigo Rei de Atlântida. 
Ruth, agora minúscula diante dele, sente-se como uma criança diante de um deus. Ele a observa com uma expressão serena e sábia, e estende a mão. Com delicadeza, a levanta na palma, como se ela fosse feita de vidro. 
Sua voz ressoa em sua mente — profunda, calma, como o som do oceano em repouso: 
 
— Não é a força que abre o caminho, filha das marés. Mas o coração que compreende o valor da vida... 
 
Ruth o encara, assombrada e fascinada. Tudo à sua volta pulsa como se estivesse viva. E ali, naquela dimensão suspensa entre mundos. 
 
— Quem és tu, jovem? — A voz ecoa dentro da mente de Ruth, profunda e retumbante, sem que os lábios do gigante se movam. 
— Ruth — responde ela, firme, apesar do temor que sente. 
— E o que buscas neste lugar sagrado? 
— A Chave da Vida. 
 
O rei a observa em silêncio por um longo instante. Quando volta a falar, há um peso em sua voz, como se cada palavra carregasse séculos de responsabilidade. 
 
— Tu não és digna de portar tamanha força. 
 
Ruth baixa os olhos por um momento, mas logo os ergue com determinação. 
 
— Eu sei... e mesmo assim, não me importo. Preciso tentar. Preciso ajudá-los. 
 
O gigante se inclina ligeiramente, os olhos como poços negros e antigos. 
 
— O poder da Chave não é salvação. É fardo. Sua luz pode curar... mas sua sombra é destruição. Maior do que teu coração pode imaginar. 
 
Ruth sente a mão do rei estremecer levemente sob seus pés. Mas ela permanece firme. 
 
— Mesmo assim... prefiro arriscar tudo por quem amo, do que ficar de braços cruzados. 
O silêncio que se segue é mais pesado que qualquer julgamento. 
 
Ao redor deles, o espaço começa a se distorcer. As estrelas se apagam por um instante, e então, como cortinas se abrindo, surge uma nova visão: uma ilusão vívida toma forma no plano astral. 
A grandiosa Atlântida — viva, pulsante, resplandecente — aparece diante de Ruth. E, em segundos, é consumida. 
Explosões de energia. Ondas de destruição varrendo torres, templos e jardins. Pessoas fugindo, gritos calados na memória do tempo. Tudo desfeito pela mesma força que agora ela busca. 
O rei observa a cena com pesar nos olhos eternos. 
 
— Para manter a Chave protegida... — sua voz soa mais baixa agora, carregada de arrependimento — decidi me selar junto a ela, usando minha própria essência como prisão. 
Ruth o encara, confusa. 
— Então...? 
— A Chave escolhe seu portador, garota. Não se domina tal poder, apenas se é escolhido por ele. E quem o recebe... carrega a vida e a morte em igual medida. 
— Mas... — ela hesita, absorvendo tudo — se é a Chave da Vida... por que causou tamanha destruição? 
 
O rei desvia o olhar, como se ainda carregasse o peso de sua escolha. 
 
— Porque eu não era o escolhido. — Ele a encara novamente, sério. — Tentei protegê-la... a qualquer custo. E esse custo foi a ruína do meu povo. 
 
O silêncio volta a cair. Mas agora, Ruth entende. Não é apenas uma chave. É uma responsabilidade que só pode ser carregada por quem valoriza, acima de tudo... a vida. 
 
No castelo, a tensão só aumenta. A equipe começa a perceber: Lucian está antecipando todos os seus movimentos, como se lesse seus pensamentos. 
Com um movimento brutal, ele agarra Gabriel pelo pescoço e o arremessa contra uma das colunas. O impacto é seco, a pedra se parte — Gabriel cai ao chão, sem fôlego. 
Lucian se vira e agarra Aurora pelos cabelos, erguendo-a. Seus punhos disparam como martelos em seu tórax — um, dois, três... cada golpe mais pesado. Aurora cospe sangue antes de cair no chão, sem forças para reagir. 
— Filho da mãe! — grita Jéssica, atacando por trás com seus tessens. 
Mas Lucian a derruba com facilidade. Montado sobre ela, começa a socar seu rosto contra o chão, o som abafado e violento. Cada soco mais cruel que o anterior. 
Ele se ergue, pega uma das lâminas de Aurora do chão e diz com um sorriso frio: 
— Obrigado. 
Ergue a arma para o golpe final. 
Uma flecha silva pelo ar. 
A lâmina voa da mão de Lucian, atingida com precisão. Jéssica, ofegante, sorri ao ver Leonardo surgir na entrada, arco em mãos. 
— Fique longe dela. 
Lucian encara, curioso. Antes que possa reagir: 
— Você engrossou a voz? — pergunta Gabriel, cambaleando, tentando se levantar. 
— Isso não vem ao caso. — responde Leonardo, sério. 
Lucian avança em um piscar de olhos, tentando desferir um chute direto no rosto do recém-chegado — mas Leonardo bloqueia, com esforço. Em seguida, revida com força suficiente para lançar Lucian metros atrás. 
Ele não hesita. Em um movimento fluido, saca o arco e começa a disparar. 
Lucian desvia de todas. 
— Ah, garoto... se esforce ao menos. 
— Eu sei. — responde Leonardo, firme. 
Ele aperta um botão no arco. As próximas flechas se conectam por correntes elétricas, que se enrolam em Lucian, imobilizando-o em meio a faíscas. 
Com um grito, Leonardo desfere um chute poderoso no peito do oponente, lançando-o para o andar inferior. 
— Qual é, foi fácil. — diz ele, tentando esconder o cansaço. 
Mas então — outra flecha corta o ar, por pouco errando sua cabeça. 
Ele gira o corpo, em guarda. 
Lucian reaparece, subindo de volta lentamente, com um sorriso sinistro. 
 
— Tem certeza? — pergunta, já preparando outro ataque. 
 
Leonardo respira fundo, olhos firmes. 
 
— Pode vir. 
 
No plano astral... 
Ruth vê. Não ouve, mas sente: seus amigos estão perdendo. Gabriel, Jéssica, Aurora... eles caem, um a um, tentando resistir a Lucian. A dor deles ressoa dentro dela como um grito abafado pelo tempo. 
Ela se vira para o rei, desesperada. 
 
— Por favor... eu preciso defendê-los. Eles são minha família — Seus olhos estão marejados, mas sua voz é firme — Você perdeu seu reino por causa desse poder... então permita que eu o use. Se não for para restaurar o que foi, que ao menos sirva para proteger o que ainda existe. 
O rei a observa, em silêncio. Lentamente, um brilho azul começa a pulsar em seu peito. Ele vê com clareza agora: Ruth carrega em si o amor pela vida — moldado não pela pureza, mas pela dor e pelas escolhas. É a portadora perfeita. 
 
— Prometa-me uma coisa. — diz ele, sua voz agora mais suave, quase humana. 
— O quê? 
— Destrua este castelo. É apenas um monumento da minha falha como rei. 
— Tem certeza? 
— Sim. — Ele olha para o horizonte do vazio astral. — Perdi meu povo. Muros e pedras não fazem um lar. Só restam memórias... e algumas devem ser deixadas para trás. 
 
Ruth sorri, triste, mas determinada. Ela inclina levemente a cabeça, em sinal de respeito. Uma promessa silenciosa é feita. 
O rei fecha a mão onde ela repousa, e sua essência se desfaz em luz. Como um rio de energia, sua alma flui até o centro da mão de Ruth, cristalizando-se em uma pedra de safira, pulsante, quente ao toque — a Chave da Vida. 
Antes que tudo desapareça, ele a encara uma última vez. 
 
— Antes de partir, preciso perguntar algo. 
— Diga. 
— Sou uma assassina. Como posso ser digna de algo tão sagrado? 
 
O rei sorri, e por um instante, há ternura em seus olhos milenares. 
 
— Justamente por isso. Porque quem tira vidas... entende melhor do que ninguém o valor que elas têm. O quão curta podem ser. 
 
A escuridão se dissipa. 
Ruth desperta — deitada entre os escombros — e em sua mão, a pedra azul cintila. 
A Chave está com ela. 
Leonardo ainda resiste. 
 Sozinho, cansado, com o arco danificado e os olhos fixos em Lucian, ele se recusa a cair. 
Mas a vantagem começa a virar. 
Lucian sorri — aquele sorriso frio e cruel — e num movimento rápido, desfere um chute giratório direto no rosto de Leonardo, que voa e rola pelo chão. 
Lucian avança para o golpe final. 
Então, uma rajada de água o atinge em cheio, arremessando-o contra a parede. 
Todos se viram, atônitos. 
Ali está ela. 
Ruth. 
De pé, com os cabelos dançando no ar úmido, as pupilas brilhando em azul intenso, e uma pedra luminosa pulsando entre seus dedos. 
 
— Achei que “Chave da Vida” realmente ia parecer uma chave — diz Leonardo, sorrindo, com o rosto machucado, mas aliviado. 
— Eu também — responde Jéssica, com um sorriso fraco, deitada entre os escombros. 
 
Ruth levanta a mão e uma leve chuva começa a cair apenas sobre eles — cristalina, quente, restauradora. 
Feridas começam a fechar, ossos a se alinhar, e a respiração volta ao normal. 
 
— Vão. Eu cuido dele. 
 
Os outros se entreolham, incertos. 
 
— Vão — repete ela, agora com firmeza, com a autoridade de quem carrega um poder ancestral. 
— Tem certeza? — pergunta Aurora. 
— Sim. O ar aqui dentro não vai durar muito. 
 
Eles assentem. Um a um, partem. Lucian se ergue lentamente, olhos fixos na pedra em sua mão. 
 
— Isso me pertence. 
— Que pena... — Ruth levanta o queixo, olhos brilhando mais forte — Ele me escolheu. 
 
Com um gesto, múltiplos jatos de água disparam em sua direção, forçando Lucian a recuar. Ele tenta se aproximar, mas é engolido por uma tromba d’água que o lança contra o teto quebrado do castelo. 
 
— Como eu disse... — Ruth fecha os olhos — Vai ficar difícil respirar aqui. 
 
Ela abre os braços e o castelo inteiro treme. O som da água se intensifica — não um gotejar, mas um rugido ancestral. 
Ruth abaixa os braços. Correntes de água começam a invadir o lugar como um dilúvio contido, guiado por sua vontade. 
Ela fecha os punhos — e tudo cede. 
O castelo desmorona com estrondo, tomado pela pressão da água. Muros, colunas e memórias afundam em meio ao redemoinho. 
Ruth, agora envolta por um brilho azul, nada com uma velocidade surreal. Ela vê que Lucian escapou, mas já não o segue. 
Ela tem uma missão maior. 
À frente, vê seus amigos nadando para a superfície. Com um gesto do braço, forma uma onda suave, poderosa, como um abraço do oceano, que os envolve e os projeta para fora da água. 
Todos pousam no jato, ainda surpresos, mas sãos. 
Ruth emerge logo em seguida, flutuando por um instante antes de pousar suavemente com os pés no chão da nave. 
A Chave da Vida ainda brilha em sua mão. 
Ela cumpriu sua promessa. 
 
— O que foi isso? — pergunta Leonardo. 
— Conseguimos a primeira chave — diz Ruth. 
— Não sabia que elas podiam dá habilidades para um hospedeiro. — diz Aurora. 
— O Stamas tem muito o que explicar. — diz Jéssica. 
 
Chegando na Sede... 
Todos descem e são recebidos por Samantha, Guilherme e Ilidan. 
 
— Conseguiram — diz Samantha, com ânimo em seu tom — Parabéns. 
— Isso fica com vocês? — pergunta Ruth, se referindo a Chave da Vida. 
— Vamos falar com o Stamas. 
 
Eles entram e Ruth puxa Leonardo. 
 
— Ei, foi muito corajoso o que fez — diz ela — Não teríamos conseguido sem você. 
— Agradeça ao Guilherme, ele que botou o sistema de segurança pessoal. 
— Eu o que? — pergunta ele se metendo na conversa. 
— O sistema que botou nos uniformes. 
— Eu não botei nada. 
— Mas a Carmen... Claro, foi um plano dela. 
— É uma inteligência artificial poderosa. 
 
Guilherme segue os outros e Leonardo continua: 
 
— Então, ela também inventou seu medo de profundidade? 
— Não. 
 
Quando chegam perto de Stamas, ele sente a presença da Chave e se afasta. 
 
— O que foi? — pergunta Gabriel. 
— Não posso encostar nisso novamente, esqueceu? 
— Por que? — pergunta Jéssica. 
 
Ele próximo a Ruth, que estava com a chave, com a mão direita tenta pegar em sua mão e de repente, uma rajada de energia o atinge e o joga para longe. 
 
— Isso foi apenas um pouco — diz ele se levantando — Se eu ficar mais perto, eu morro. 
— Podemos criar um isolante energético. — diz Guilherme. — Assim, poderá ficar perto sem que se machuque. 
— Bom, então eu fico? — pergunta Ruth. 
— Sim, a Chave escolheu você. — responde Stamas. 
— Lá, eu consegui fazer umas coisas com a água, o que foi aquilo? 
— A Chave da Vida dá habilidades especiais para seu portador. Isso é uma pequena amostra do que pode fazer. 
— E o cara que estava com a gente? — pergunta Jéssica, entrando na sala. — Lucian, quem era? 
 
Ilidan procura no computador através do reconhecimento facial que a câmera das máscaras capturou. 
 
— Aqui está — diz ele pondo a foto no monitor principal. 
— Eu conheço ele. — diz Stamas. 
— Conhece? — pergunta Samantha. 
— Sim, é um dos 4 guerreiros da dimensão do meio. 
— Quem? — pergunta Gabriel. 
— Eu e mais três pessoas foram criadas no templo. Lá, formos treinadas e botadas nossas habilidades ao máximo... Ele era meu melhor amigo. Achei que tivesse sumido. 
— Seu amigo ou não, ele quer as chaves. — diz Ruth. 
— Precisam achar as chaves antes dele. Elas escolhem o portador pela sua essência, e ele rouba isso. 
— O que!? — pergunta Gabriel. 
— Ele pode ficar com sua essência, suas habilidades, até seu estilo de luta. Praticamente, ele consegue se tornar um clone seu. E se isso acontecer, ele pode ser um portador das Chaves... Até mesmo de todas elas. 
— Por isso ele tava pálio a pálio com a gente — diz Leonardo. 
 
Stamas estala os dedos e diz: "Vão, vocês ainda estão em aula" e eles são substituídos pelos seus devidos clones. 
 
— Não pareceu tão surpreso — diz Guilherme, um pouco desconfiado. 
 
Stamas não responde, apenas abre o livro e diz: “Temos que achar a próxima o quanto antes”. 
 
No museu Orsay... 
Uma personificação das sombras vai até a sala onde estava o livro, mas quando chega lá, ver apenas o espaço vazio. 
 
— Droga. — diz uma voz feminina — O pirralho vai me pagar. 
 
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